Resultados do 1º turno das eleições para reitor da USP

21/10/2009 at 00:39 (Notícias) (, , , , )

Diretor da Física São Carlos vence 1º turno para reitor da USP

Glaucius Oliva recebeu 756 dos 1.641 votos nesta terça-feira, 20; índice de abstenção foi de 15%
SÃO PAULO – O primeiro turno para eleições para reitor da Universidade de São Paulo (USP) colocou nos três primeiros lugares os diretores do Instituto de Física de São Carlos, Glaucius Oliva, o da Faculdade de Direito, João Grandino Rodas, e o pró-reitor de pós-graduação, Armando Corbani, nesta ordem. A apuração dos 1.641 votos – com abstenção de 15% – ocorreu na noite desta terça-feira, 20. O segundo turno do pleito gera uma lista de três nomes, que são encaminhados para o governador José Serra (PSDB) determinar o vencedor.

Oliva recebeu 756 votos; Rodas, 643; e Corbani, 423. Em seguida vieram o professor do Instituto de Matemática e Estatística Francisco Miraglia (293), a diretora da Faculdade de Educação, Sonia Penin (272), o pró-reitor de cultura e extensão Ruy Altafim (202), o coordenador da Comunicação Social Wanderley Messias (167) e o diretor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Sylvio Sawaya (69).

A atual reitora, Suely Vilela, afirmou que “os que estão liderando estão bem preparados”. Ela também disse que o seu substituto deveria se preocupar em organizar a avaliação dos cursos de graduação. A instituição não participa do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade). Suely também defendeu mudanças no processo eleitoral, criticado por estudantes e funcionários, que têm baixa representatividade. “Todos deveriam votar, mas poderia seguir a proporcionalidade estipulada pela LDB”, diz, referindo-se à lei federal que pede eleições universais nas universidades, mas com peso maior para os votos dos professores. Segundo ela, não houve tempo em sua gestão para mudar o processo, apesar de ter isso sido debatido.

Protestos

Dois protestos realizados nesta terça-feira na Cidade Universitária foram os únicos sinais visíveis de movimentação política. Os estudantes pedem eleições mais democráticas, com maior participação de alunos e funcionários. Cerca de 1,9 mil eleitores, dos quais 165 são alunos, poderiam votar para escolher o 25º reitor da instituição. O primeiro turno determina uma lista com oito candidatos ao cargo, já que todos os professores titulares da USP podem receber votos. No dia 10, um colégio eleitoral menor escolherá a lista tríplice que vai ser enviada ao governador José Serra (PSDB).

Uma das manifestações ocorreu no período da manhã, no Instituto de Psicologia, enquanto professores, alunos e funcionários se dirigiam às urnas. Teve faixas e distribuição de panfletos, propondo um maior peso para alunos e funcionários no pleito. A segunda partiu da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) e reuniu cerca de cem estudantes que caminharam com faixas, carro de som e rojões até a reitoria. Durante alguns minutos, paralisaram o trânsito na Avenida Luciano Gualberto. Não houve confronto, apenas discussões com motoristas que tentavam furar o bloqueio. O Diretório Central dos Estudantes da USP (DCE-USP) coordenou as duas manifestações.

Nas demais unidades, o clima foi tranquilo. No câmpus da Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB) houve uma única urna. Em Ribeirão Preto, das 285 pessoas que tinham direito a voto, 268 compareceram. Das 114 pessoas com direito a voto nos câmpus de Piracicaba e Pirassununga, 84 compareceram aos locais de votação.

Fonte: estadão.com.br

Resultados são apresentados

Foram escolhidos os oito nomes que compõem a lista de candidatos ao cargo de reitor da Universidade de São Paulo (USP), em apuração realizada no prédio da Reitoria. A colocação foi a seguinte: Glaucius Oliva obteve 756 votos; João Grandino Rodas, 643 votos; Armando Corbani Ferraz, 423 votos; Francisco Miraglia, 295 votos; Sonia Penin, 272 votos; Ruy Alberto Correa Altafim, 202 votos; Wanderley Messias da Costa,167 votos; e Sylvio Sawaya, 69 votos. Os votos brancos totalizaram 1.551 e, os nulos, 364.

Fonte: Blog da Comissão Eleitoral responsável pelo processo de escolha do novo reitor da USP

Pois é, os votos brancos totalizaram 1.551 e, os nulos, 364, o que dá 41% dos votos.

Compare esses números com o total de votos do primeiro colocado (que totalizou 756 votos). Só uma observação…

Diretor da Física São Carlos vence 1º turno para reitor da USP

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Professores da USP pedem mudanças

03/08/2009 at 15:51 (Artigos, Notícias, Reflexões) (, , , )

da FSP (“Falha” de São Paulo)

Manifesto exorta docentes a participarem mais do processo de sucessão reitoral na universidade, que se inicia agora. Leia a segui a íntegra.

A USP precisa mudar

A Universidade precisa mudar. A USP precisa modernizar-se sem perder suas tradições de qualidade. A USP precisa assumir suas responsabilidades para com a sociedade que a mantém. O momento de escolha do novo reitor é um momento apropriado para levantar idéias – para pensar grande! Não importa qual candidato cada um de nós irá apoiar: quem for eleito deve garantir a excelência de nossa instituição num quadro novo do mundo e do conhecimento, combinando a tradição de qualidade da USP com a agilidade necessária no mundo moderno.

As mudanças globais acentuadas pela recente crise criaram novos eixos de poder político e econômico no mundo e apontaram novas prioridades, gerando oportunidades para o Brasil. Se nossa Universidade está entre as que têm maior projeção no mundo, o dado decisivo é que ela figura entre as cinco primeiras dos países que hoje, mais que antes, estão de fato emergindo. Neste quadro, o papel da USP pode ser decisivo para que nosso país cresça e assuma o lugar por que todos ansiamos. Para o futuro chegar, a USP precisa mudar. As mudanças implicam fortalecer os critérios de qualidade em todas as suas ações e mecanismos de gestão, a começar pela escolha de seu próprio reitor, favorecendo o predomínio da academia sobre os interesses menores. Isso exige subordinar os procedimentos burocráticos e de gestão às atividades-fim, despindo-os dos seus componentes ritualísticos e cartoriais.

A forma de escolha do reitor da USP precisa ser modificada no primeiro ano da futura gestão. É necessário assegurar uma participação mais ampla e representativa do conjunto da universidade na decisão final, sempre com o objetivo de aprimorar a qualidade das atividades-fim da universidade. Novas formas de escolha do reitor devem ser discutidas com a comunidade acadêmica. Seja pelo reforço do atual colégio eleitoral do primeiro turno ou pela sua ampliação, estamos de acordo quanto à premência da mudança, quanto à importância de que qualquer reforma preserve e aumente a qualidade da USP, e quanto a pelo menos a eliminação do atual colégio do segundo turno.

Porém, as mudanças na estrutura do poder são apenas parte das alterações que garantam a melhora da qualidade de nossa instituição. Temos grupos fortes e altamente competitivos, ao lado de grupos incipientes ou que necessitam crescer ou se aperfeiçoar. A existência de grupos ou cursos de reduzida relevância acadêmica, quer no ensino ou na pesquisa, é sim responsabilidade da reitoria e das diretorias, e exige formas criativas de intervenção por parte das autoridades acadêmicas, visando a garantir que uns mantenham ou ampliem a sua liderança e outros passem a estar à altura da missão da USP. A instituição tem que atuar em conjunto, sinérgica e complementarmente, evitando a competição interna que arrisca desagregar o ethos comum da universidade.

A liderança e a competência intelectual de muitos Professores da USP edificaram a tradição de qualidade desta Universidade. Grupos e cientistas bem sucedidos também trazem significativas contribuições para a universidade, aplicadas em equipamentos, laboratórios, reagentes, instrumentos e bolsas. Mas as dificuldades criadas para infra-estrutura e gestão, acompanhadas muitas vezes de atitudes de rejeição à liderança destes cientistas nas estruturas departamentais, levaram a seu progressivo afastamento da vida da universidade: buscaram isolamento e independência, recorreram a mecanismos ágeis de gestão de recursos extra-universitários. Esses grupos têm que ser ativamente reincorporados ao funcionamento da instituição, seus líderes precisam receber incumbências compatíveis com sua expressão científica, os entraves administrativos e de gestão de recursos necessitam ser resolvidos e simplificados, para que a própria universidade possa assumir todas ou a maior parte das ações conduzidas por centenas de entidades que a ela vão se somando de forma incontrolada. Essas seriam importantes medidas para conter as forças centrífugas que tendem a desagregar a USP.

A USP tem o maior quadro de pesquisadores e especialistas entre as universidades brasileiras. Não pode isolar-se: sem se partidarizar, tem que dialogar com os governos e com a sociedade que a mantém. Além de sua missão educacional, a USP tem o dever de criar conhecimento, contribuir com soluções e prover especialistas para resolver gargalos e ajudar a promover o desenvolvimento do país.

Os desafios que o Brasil enfrenta são de duas ordens: déficits e oportunidades. O rol de tópicos nos quais a intervenção da USP pode ser de grande valor é muito amplo, e a título de exemplo dos nossos déficits sociais podemos lembrar a violência com suas múltiplas raízes; a desigualdade em todas as suas dimensões; a crescente poluição; o desnecessário antagonismo entre por um lado o desenvolvimento e por outro a biodiversidade e a culturodiversidade (por exemplo, a extinção de línguas indígenas, o estudo de culturas como a coreana e a boliviana, dois povos que estão se incorporando ao nosso dia a dia); o risco de que a capital de S. Paulo seja paralisada pelo trânsito, abafando sua pujança econômica, social e cultural; a extraordinária mudança do perfil demográfico, em que o crescente aumento da proporção de idosos se associa à extrema redução da natalidade, fenômeno que já afeta todas as atividades, do atendimento à saúde até o planejamento urbano, passando pelas relações de trabalho e a previdência social. Mas a maior contribuição que a USP precisa e pode dar ao país e ao Estado de S. Paulo, em proporção muito maior do que o faz, é com relação à educação em todos os níveis.

E há também as grandes oportunidades para o Brasil: podemos ser a primeira potência ambiental do planeta, temos especialistas capazes de liderar os grandes desafios que vão ditar o ritmo do crescimento dos diferentes países, como a biotecnologia, a nanotecnologia, a geração sustentável de energia, o uso da água. Nossa diversidade cultural pode revelar fontes de riquezas insuspeitas, que podem se converter em contribuições científicas, tecnológicas e sociais inovadoras.

A USP tem uma responsabilidade especial com o ensino de graduação especialmente com a qualidade e com as mudanças necessárias num mundo de profissões mais variadas, de uso intenso de instrumentos de educação a distância, de educação continuada de estudantes, profissionais e professores, com a criação, revisão, fusão e extinção de cursos. Ela deve levar cada vez mais em conta seu papel de propor modelos e iniciativas inovadoras, em lugar de repetir aquilo que outras instituições podem fazer em volume maior. Ela deve renovar a formação universitária, para que nossos alunos enfrentem uma vida que só pode ser abordada de forma interdisciplinar; deve entender que as profissões se multiplicaram e nem sempre estão ancoradas num diploma.

Para isso, a estrutura acadêmica e departamental tem que ser reformada, para se liberar do imobilismo e da burocracia que subordina o mérito ao rito. A burocracia universitária não é produto exclusivamente de uma elite de servidores, mas também do conservadorismo dos professores, especialmente aqueles encastelados em posições administrativas ou em milhares de comissões da universidade ou das unidades. Cabe ao reitor e pró-reitores quebrar a estagnação derivada do exercício cego e repetitivo das rotinas e observância inquestionável de regras que deveriam ser fugazes e transitórias e não transformadas em leis imutáveis.

A USP tem mais que o dobro dos programas de pós-graduação do que a universidade subseqüente. Abrange quase todos os setores do conhecimento em seus mais de 200 programas, 90% deles incluindo doutorado, caracterizados por alta qualidade e liderança. A USP já formou mais de metade dos doutores do Brasil, e hoje titula quase um quarto: essa própria redução é uma das provas de seu sucesso, pois grande parte dos novos programas de pós-graduação são liderados por egressos da USP, que hoje se encontram em todas as unidades da federação e em praticamente todas as universidades brasileiras. O Sistema de Pós-Graduação do Brasil deve seu formato e sucesso atuais em grande medida à USP. Por isso mesmo, cabe à USP a grande responsabilidade de renovar a pós-graduação. Sem abandonar as metas quantitativas, deve ela focalizar-se nos seus novos desafios, como por exemplo fazer um grande esforço para cursos que extrapolem as barreiras disciplinares clássicas, que lidem com a complexidade do mundo e do saber, em novas formas de articular os grupos de pesquisa e as áreas de pensamento. Nesta nova visão deve ter um lugar muito proeminente o pós-doutorado, principalmente tendo em vista que os docentes e pesquisadores de todo o sistema brasileiro de pós-graduação, espalhado nas universidades mais tradicionais e naquelas que estão sendo expandidas, precisarão de apoio importante para manter e consolidar suas atividades científicas. Essa talvez seja a contribuição mais relevante que a USP possa dar no futuro para o sistema universitário brasileiro.

A avaliação é instrumento central na de gestão em qualquer instituição, pública ou privada. Avaliação é, também, elemento chave na definição de metas e na prestação de contas à sociedade. Avaliação de metas deve fazer parte da vida diária da USP, em todos os níveis. Não pode ser um fenômeno episódico, um exercício amadorístico, nem ser o foco de pressões de grupos variados dentro da própria universidade para controlar-lhe os desfechos. Deve ser um processo cujo produto final, no lugar de apenas alimentar as páginas dos noticiários, sirva à Reitoria, às diretorias e ao próprio governo para melhorar o desempenho da USP.

Em suma, precisamos de uma universidade dinâmica que, sem abandonar suas raízes, se mostre aberta às mudanças que garantam sua excelência. Seu reitor necessitará de autoridade científica, representatividade acadêmica e compromisso social para fortalecer as boas potencialidades, reunificando a instituição, restaurando-lhe o entusiasmo e o vigor, qualidades que devem estender-se a todos os que venham a participar da gestão. Somos nós, todos os que se empenham na qualidade universitária, que precisamos dizer como a USP deve ser, e buscar um reitor que tenha compromisso com as melhores idéias e real possibilidade de executá-las. Exortamos nossos colegas a trazer a público suas idéias mais preciosas, seus ideais mais valiosos, para que a sucessão reitoral ultrapasse a simples escolha de um nome e seja a ocasião de se reafirmar a ousadia científica e a responsabilidade social de nossa universidade.

Adalberto de Fazzio
Instituto de Física da USP

Glauco A. Truzzi Arbix
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP

Hernán Chaimovich Guralnik
Instituto de Química da USP

Jorge Kalil Filho
Faculdade de Medicina da USP

Marco Antonio Zago
Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP

Renato Janine Ribeiro
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP

Vahan Agopyan
Escola Politécnica da USP

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Mas há primaveras – Carta da professora Adma Fadul Muhana

27/06/2009 at 17:17 (Artigos, Reflexões) (, , , , , , , )

Carta da professora Adma Fadul Muhana

Mas há primaveras

A comunidade universitária e a opinião pública têm procurado, atônitas, acompanhar os acontecimentos recentes na Universidade de São Paulo. Como acreditar que professores, alunos e funcionários da USP, em especial da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, sejam criminosos cujos atos merecem ser severamente reprimidos com bombas de efeito moral, gás lacrimogêneo e gás pimenta? Como acreditar que querem destruir seu patrimônio, agir com violência e causar danos aos demais? quem acredita nisso? por quê?

Se se compararem as informações e declarações dos últimos dias, será possível repor a situação. Em plena negociação salarial, em 25 de maio, a Reitoria fechou as portas do prédio e não deixou parte da comissão de negociação entrar. Ao agir assim e quebrar a regra da cultura democrática instituída, não era improvável que soubesse da reação dos estudantes que, impedidos de entrar, poderiam forçar a porta e fazer uma “invasão” relâmpago. Mas, depois dos acontecimentos de 2007, havia uma resolução do Conselho Universitário autorizando a Reitoria a chamar a polícia quando julgasse necessário, a qual foi aplicada.

Docentes e estudantes sabem ensinar e estudar, principalmente. Talvez até, de um modo um tanto canhestro e desafinado, também saibam protestar. Alguns estudantes gritam e chegam a tirar cadeiras e pô-las diante das salas de aula, impedindo a entrada nelas – sinais de sua impotência, de sua insegurança e da desinformação acerca de outros canais de manifestação mais legítimos e eficazes, de que os professores (ainda) dispõem. Mas essa alegada “violência” estudantil não tem parâmetro com as armas usadas pela PM, treinadas para eliminar malfeitores, e descontentes… Inacreditavelmente, a atual reitora da Universidade de São Paulo pensa que sim!

Isto é ofender a USP e todos os seus membros. Pretextando grupelhos, radicais e sabe-se lá mais o quê, a Reitoria entregou a direção da universidade a um comandante policial. Ao ser alertada por um docente de que a presença da polícia no campus poderia causar graves danos físicos e morais a membros da comunidade, e de que as armas utilizadas pelas tropas contemplavam escopetas e metralhadoras, a reitora limitou-se a dizer que a escolha das armas adequadas à ação policial não era da sua alçada. A reitora transferiu sua responsabilidade pela vida dos estudantes, professores e funcionários, das crianças e adolescentes que estudam na Escola de Aplicação, e de todos aqueles que livremente transitam pelo campus Butantã da USP, a um coronel da PM.

Os professores da USP não estavam em greve. A campanha salarial e a carreira docente importam aos professores porque sabemos o efeito nefasto que salários aviltados causam ao ensino, como temos visto na precarização do ensino secundário. Os mais velhos se lembram de como o ensino médio público era padrão de qualidade para a escola privada, o que hoje nos parece um sonho desaparecido. A recuperação salarial nos importa para que a Universidade pública não passe a ter salários tão baixos que os melhores profissionais prefiram se afastar dela e servir apenas à iniciativa privada, com seu principal interesse no lucro, e levando ao desaparecimento das investigações independentes que interessam ao coletivo. Lutar por salários, todos sabem, é lutar por deixar uma universidade com melhor qualidade e para que a USP tenha o que comemorar daqui a 25 anos.

Os estudantes da USP não estavam em greve. O temor relativo à Univesp, ou Universidade Virtual do Estado de São Paulo, provém da convicção de que a expansão virtual da Universidade se fará à custa da qualidade do ensino e em detrimento das políticas de permanência estudantil por que vêm lutando, da construção de salas de aula presenciais, bibliotecas, laboratórios, moradias e restaurantes universitários, temor compartilhado por alguns professores que relataram desconfianças na implantação do Programa.

Todos estes são assuntos importantes para homens e mulheres que, trabalhando dentro da Universidade, abdicaram de ser meros consumidores e reprodutores de um saber para, com diversas dificuldades, se tornarem sujeitos de conhecimento, de ação e de transformação da sociedade. Requeriam, pois, que decisões dessa monta fossem tomadas com o conhecimento da ampla maioria da comunidade acadêmica, e não por decretos e resoluções. Todavia, recusando-se a negociar, a esclarecer, a Reitoria da USP teve como única resposta para a dificuldade do momento inventar uma ocupação para chamar a polícia. No dia 9 de junho os professores em assembléia, pensando em conjunto como retomar as negociações, ouviram tiros e gritos que dificilmente esqueceremos. Do prédio da Reitoria, de uma de suas janelas, umas dez cabeças assistiam ao lúgubre espetáculo de alunos e professores fugindo das bombas e sendo acuados no prédio da História. Apesar disso, e embora vários colegas tenham tentado contatos com a reitora, a fim de evitar um desfecho de proporções inimagináveis, ninguém, em momento algum, atendeu aos chamados dos docentes. Contatado, finalmente, o governador se calou: as armas já tinham falado por ele. Passado o furacão, reitoria e aliados vêm a público se manifestar e justificar atos injustificáveis.

O tecido universitário está desfeito. Todos os que defendem uma universidade pública, com direito a discussões, propostas, ações solidárias e coletivas, deixamos de reconhecer a reitora como interlocutora de nossa prática acadêmica. É verdade que, dentro e fora da Universidade, há os que aprovam a ação da polícia, alegando destruição do patrimônio público; desqualificam a decisão das assembléias em favor da greve, apelando para o direito dos que querem aula, embora não compareçam a elas; contestam os piquetes de funcionários e alunos, argumentando serem contra uma “violência generalizada”. Essas mesmas vozes recorrem a proposições vagas e metafísicas, que, descoladas de seu contexto político, ridicularizam o direito “à diferença”, “à opinião” etc.; mas se calam diante de questões materiais decisivas para a Universidade estadual, como a destruição do patrimônio público perpetrada, esta sim, pela polícia e por fundações privadas instaladas no interior da USP. Negando o direito à greve e a piquetes, propõem em seu lugar que cada um faça o que bem entender, desde que confortavelmente instalados em seus gabinetes particulares, ao abrigo do espaço coletivo e presencial de discussão. Parecem supor que a condenação das assembléias de professores e estudantes é feita ainda em favor do direito do aluno, como pagador de impostos, de ter sua mercadoria-aula. Ao sobreporem a figura do consumidor à do cidadão, transferem a cultura da universidade privada para dentro da Universidade pública, transformando os grevistas em anti-cidadãos-vendedores que não cumprem sua parte no troca-troca do mercado – como se estes não pagassem também seus impostos e não tivessem direito a forma alguma de dissidência. Certamente que, assim, esse discurso cala-se diante da destruição da Universidade pública levada a cabo por governos neoliberais e encobre sua adesão à mesma ordem de coisas, sob a capa de uma pretensa motivação pacifista.

Neste sentido, a Universidade deve se envergonhar de que uma parte do seu corpo docente e discente não condene a ação policial contra atos de caráter político: pois isso significa que essa parte não se importa com o coletivo e com o tipo de conhecimento e ética que estão sendo transmitidos nessa Universidade. A sociedade deve saber disso e querer que, na Universidade de São Paulo, os professores, os médicos, os arquitetos, os atores, os engenheiros, os biólogos, os psicólogos e todos os que aí se formam, com a contribuição de todos nós, visem mais ao bem coletivo que ao seu único e próprio lucro. E fazer parte da coletividade implica ter de olhar para além do seu escritório particular, do seu consultório e da sua sala de aula.

Agora a Universidade de São Paulo está em greve, exigindo a retirada imediata e definitiva da polícia no campus, para que retornem as condições de diálogo entre todos os envolvidos. Mas desde que a Universidade foi violentada com a permissão, ou pior, a mando de seus dirigentes, os professores requerem que a atual reitora se afaste do cargo e torne a ser algo de que possa se orgulhar: professora. Oxalá, assim, o próximo reitor compreenda que uma universidade não se faz virtualmente, nem com tropas militares, mas com docentes, estudantes e funcionários preocupados com o ensino e com a pesquisa, e sobretudo, com fazer parte de uma menos triste humanidade.

Essa carta foi enviada a diversos veículos de comunicação, mas por motivos óbvios.

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Sombras sobre a USP

21/06/2009 at 13:53 (Artigos) (, , , , , , , , , )

Por MARCELO COELHO

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Se as “minorias radicais” conduzem o processo, onde estão as maiorias moderadas?
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UM GRUPO de provocadores ameaça a ordem e o Estado de Direito. Impossível negociar com extremistas desse tipo, dado o irrealismo de suas reivindicações. Para preservar a paz da comunidade e o império da Lei, a saída é a intervenção de uma força militar.
Esse raciocínio pode ser aplicado, sem grande irrealismo, à crise vivida na Universidade de São Paulo. De fato, há minorias radicais. Tudo indica que é impossível negociar com elas. De fato, a ordem deve ser preservada. Tudo indica que o patrimônio público precisava ser defendido de invasões e quebra-quebras.
Só que a fraseologia não difere muito da que justificou o golpe militar de 1964.
Aquela época tinha seus extremistas, dispostos, por exemplo, a fazer a reforma agrária “na lei ou na marra”. Eram, certamente, minoritários na população. Havia uma ordem a ser preservada, e uma legalidade para a qual os movimentos de massa não conferiam grande importância. Só uma intervenção militar daria conta da “baderna”.
É triste ver pessoas de belo currículo democrático, notoriamente perseguidas pelo regime militar, apoiando a ocupação da USP pela PM. Sem dúvida, a polícia age agora com autorização judicial e o golpe de 1964 foi, afinal, um golpe.
Do ponto de vista político, entretanto, as situações se assemelham. Como em 1964, muitos “democratas” agora acham que é preciso reprimir pela força as “minorias radicais”, contando com o aparato militar para defender a ordem, contra a “baderna”.
Este artigo -prometo- será imparcial. Não vejo valor em alguns argumentos do lado contrário. É muita abstração condenar a presença da PM porque a universidade é um local “de pensamento, não de violência”, “de ideias, não de barbárie”.
A USP é isso, mas não é um jardim peripatético: é também um lugar de trabalho, onde pessoas ganham salário, reclamam, fazem greves, piquetes e invasões.
Piquetes e invasões não são atos isentos de violência, e palavras de ordem não costumam ser obras-primas de reflexão e de pesquisa. De resto, há uma diferença óbvia entre intervenções armadas que se dedicam a sufocar o pensamento e a liberdade de cátedra, e as que se encarregam de reprimir militantes sindicais.
Convocar a PM foi um erro. Só serviu para acirrar, e não pacificar, os ânimos na USP. A retirada da PM é o primeiro passo para a superação da crise.
O problema é saber por que se chegou a esse ponto -em que pessoas respeitáveis acabam achando que “só a PM resolve essa baderna”. Quando acontece isso, um sistema de representação e de poder se revela disfuncional. A política deixa de funcionar e a força prevalece.
Se “minorias radicais” conduzem o processo, cabe perguntar onde estão as maiorias moderadas. Deveriam estar presentes nas assembleias (e piquetes) que decidem mobilizações em nome de todos.
Nada mais alienado do que condenar o fato de uma assembleia “de gatos pingados” ter decidido uma greve quando não se participa dela.
Estivesse presente nas assembleias, a “maioria ordeira” da USP negaria legitimidade aos movimentos de reivindicação. Em última análise, prefere delegar a defesa da ordem à PM.
Diante de dezenas de ativistas enraivecidos, quatro policiais (que não são “a repressão”, mas têm nome, estado civil e endereço) foram cercados e humilhados moralmente. Quando chegou o reforço, professores, funcionários e estudantes (que têm nome, estado civil e endereço) foram atacados com gás e balas de borracha.
Tudo se desumaniza, porque está em jogo uma contradição estrutural. Temos uma máquina burocrática -a da reitoria e seus órgãos ossificados de decisão- contra uma máquina sindical -que segue a lógica da mobilização de massas.
Acontece que as massas são imaginárias (reduzem-se a uma minoria) e que a estrutura de poder na USP, supostamente defensora da lei e da ordem, é tudo menos democrática. Quando ninguém representa ninguém, ou representa mal, não há negociação humana possível, e a violência prevalece.
O mesmo dilema levou a crises violentas no sistema político brasileiro, tempos atrás. Minorias “extremistas” se iludem com a omissão da maioria “ordeira”, que não se dá ao trabalho de mobilizar-se pela “ordem” e pela “moderação”. Afinal, tem as tropas a seu dispor.

coelhofsp@uol.com.br

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